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sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

O PSDB e a Guerra de Todos contra Todos

250111_psdbcriseO Descurvo - [Hugo Albuquerque] O Partido da Social Democracia Brasileira é um dos principais personagens partidários do Brasil pós-88.
Ocupou a Presidência da República por duas vezes - e só não esteve na disputa real da cadeira em 1989, apesar da excelente votação de Mário Covas -, governou estados importantes, tem a terceira maior bancada da Câmara e é o maior partido de oposição no plano federal, hoje. Trata-se, com efeito, de uma profunda exceção no campo político ocidental (que, talvez, se repita apenas em Portugal): É um partido social-democrata que não é bem social-democrata na prática - e aqui falo dos discursos corriqueiros, das políticas de aliança ou mesmo da auto-identificação dos simpatizantes e eleitores médios -, apesar do seu nome, do seu estatuto e do seu programa atual - que, caso fossem lidos por um analista político estrangeiro não iniciado na história política do Brasil, seriam creditados a algum partido de esquerda, sobretudo por conta do seu programa original (1988) que defende até auditoria da dívida externa assim como também clama enfaticamente por uma Reforma Agrária.

Para muito além do discurso, há uma história que o precede e onde ele está inserido, na qual os fundadores do PSDB eram apenas a ala institucionalista e menos demagógica do PMDB - uma artificialidade construída pela Ditadura Militar com o intuito de legitima-la - que tomou vida por conta das disputas internas do PMDB-SP e da insatisfação com os rumos do PMDB pelo país - a entrada de políticos pró-ditadura, ainda que isso não tenha sido a causa determinante de sua fundação, mas sim a vitória de Quércia sobre o núcleo duro do PMDB paulista, onde residiam figuras como FHC, Montoro, José Serra e Mário Covas. É certo que a grande maioria dos fundadores do PSDB tinham ânimo de fundar outro partido por motivos programáticos, do contrário, teriam se usado do momento politizante das Diretas para tanto - todos pensavam, entretanto, em construir um projeto de modernização conservadora a partir da estrutura do próprio PMDB.
O partido, portanto, nasce indeterminado, vagando entre a má vontade com a esquerda formada pelos movimentos sociais e um oposicionismo institucional contra a direita pró-ditadura. E é FHC que irá determinar os destinos do partido, sobretudo, por sua atuação política pessoal, seja enquanto esteve próximo a todo momento do Poder quando era Senador - primeiro, chegando a liderar o governo no Senado durante o Governo Sarney, depois sendo próximo de Collor e de Itamar - ou quando ele resolve ser o fiador de um certo projeto de modernização conservadora, o que o aproximou do esquema do Carlismo na Bahia - e de Marco Maciel em Pernambuco, algo que se ramificava por todo Norte-Nordeste.
O PSDB pós-FHC posicionou-se à direita do centro, liderando as forças daquele espectro a partir de então, o que se acentua por conta da oposição promovida pelo PT - que àquela altura, englobava os setores que foram postos de lado no processo de estabilização econômica dos anos 90, a saber, os trabalhadores empregados, os movimentos sociais vários e mesmo a pequena indústria, setores que normalmente são representados por um partido social-democrata como manda a praxe da política europeia ou de inspiração europeia. As crises e as falhas todas cometidas durante o Governo FHC provocaram uma queda severa de sua popularidade, o que foi determinante para o desfazimento da aliança que o elegeu e o sustentou desde 1994, fato que colabora decisivamente para sua derrota em 2002 para Lula, que naquele momento construiu um potente arco de alianças ao incluir as demandas de uma direita desenvolvimentista e inclui-las junto das demandas laborais e sociais que o PT sempre defendeu.
O período todo do Governo não serviu para sedimentar a identidade do partido, comos vemos em documentos pouco divulgados, mas de importância singular única como, por exemplo, uma nota oficial datada de 2003 - e assinada pelo então Presidente do Partido, José Aníbal - que ataca a Internacional Socialista por não ter convidado o PSDB para seu XXII Congresso - realizado em São Paulo, tendo por anfitrião o Partido dos Trabalhadores (que é membro observador da organização) e cujo discurso de abertura foi proferido pelo então Presidente da República Luís Inácio Lula da Silva. O problema aqui não é ser ou não de esquerda, nem uma crítica à disputa pelo significado das palavras - que, no fim das contas, é a própria política -, mas sim da profunda insensatez que gestos como esse significam, tendo em vista os oito anos de polarização onde o PSDB se pôs, conscientemente, no campo direito (e anti-socialista) da disputa política.
As duas disputas presidenciais que se seguiram à vitória de Lula teve novos confrontos entre o PSDB e o PT, onde primeiro se viu Geraldo Alckmin concorrendo contra um Lula que pleiteava um segundo mandato sob os auspícios de um discurso moralizante e gerencial - a eleição do modelo da empresa como alternativa à política (na verdade, à democracia) - e depois a disputa envolvendo José Serra e a sucessora indicada de Lula, Dilma Rousseff, na qual o governador paulista largou o discurso centrista de 2002 - quando foi derrotado por Lula - para assumir um discurso desesperado e negativo, abraçando o que há de pior na direita nacional - os extremistas religiosos da TFP, os monarquistas et caterva - para tentar surfar em uma onda de ódio profundo sem se molhar e assim vencer. As duas derrotas - especialmente a última - repercutiram mal sobre o partido e algumas lideranças estaduais falam em refundação, quem sabe um afastamento do discurso religioso-moralista e uma retomada do "PSDB dos anos 90" - o que, por certo, trata-se de uma certa bravata anti-serrista, dada a ampla rejeição popular em nível federal da própria figura pessoal de FHC.
A crise que hoje percorre o PSDB nacional é algo que começa das próprias disputas internas para concorrer à Presidência da República ao longo do tempo - um jogo duro, onde os caciques guerreiam no interior do partido para chegarem às vésperas das eleições aclamados, sem a necessidade prévias nem quetais. Há um ano, assistíamos ao fim do confronto formidável entre José Serra e Aécio Neves, onde o primeiro derrotara o segundo, mas o derrotado, habilmente, preparou uma armadilha para o governador paulista: Serra tinha de vencer e ainda se preparar para fazer campanha literalmente sozinho. O mesmo podia ser visto em São Paulo, onde Geraldo Alckmin, candidato à chefia do governo do estado, concentrava-se na sua própria disputa - para a qual ele foi indicado pela falta de quadros no partido - ao passo em que ele largava a disputa presidencial, largando Serra, a quem tanto lhe combateu internamente, à própria sorte.
A vergonhosa derrota de José Serra em 2010, em qualquer país razoável do mundo, provocaria o fim da sua carreira política, mas o Brasil é o país da jabuticaba e a jabuticaba é única: Ele continua a se pronunciar internamente, deseja concorrer à Presidência do Instituto Teotônio Vilela - o equivalente à Fundação Perseu Abramo do PT, em suma o centro de estudos, pesquisas e doutrinação do Partido - e há quem suscite seu nome para a disputar a Prefeitura de São Paulo em 2012 (!). Enquanto isso, Aécio Neves emergiu falando alto enquanto a própria liderança da nova oposição, exatamente como tinha planejado caso ocorresse a combinação de sua vitória com a derrota de Serra, mas algo escapou ao cálculo do político mineiro: Alckmin continua discursando com autoridade - até criticando Dilma - e Serra não se retirou da vida política, portanto, a sua aclamação como líder da oposição não aconteceu. Existe uma hesitação importante entre os setores que apóiam o PSDB, seja dentro ou fora da política, em rumarem imediatamente para o séquito de Aécio.
De fato, não há refundação do PSDB, o que existe ainda é uma disputa interna pelo poder. A força de certo setor da elite paulista - não aquela ligada às corporações modernas ou as multinacionais estabelecidas no estado, mas sim certos setores mais tradicionais e locais - é resistente a Aécio como é resistente a qualquer proposta que passe por fora de São Paulo. Alckmin pode ser um político com limitações e pouca criatividade, mas sabe disso, está refazendo conexões e jogando duro para varrer o legado de Serra no Governo bandeirante. Enfim, não houve aclamação de ninguém, mas sim disputa, a velha disputa interna tucana, nos termos que ela sempre foi travada. Não é, também, a resistência do PSDB paulista que impede sua refundação: O próprio Aécio não é um nome capaz de renovar um partido, ele é um político personalista que se cerca de bons técnicos, mas não um pensador ou o líder de um movimento.
Só para citar aqui alguém insuspeito de maiores petismos - ao contrário deste humilde redator - como um Paulo Nogueira, "Aécio é a face sem rugas do atraso" - e, mesmo que eu não concorde com uma perspectiva de História centrada no binarismo progresso-atraso, tomo aqui "atraso" pelo seu sentido corriqueiro, isto é, a expressão da política tradicional brasileira - oligárquica, personalista e cordialmente autoritária -, o que torna a ironia de Paulo fina e precisa: Aécio é o tradicional irresoluto que gosta de parecer o Novo, ele aceita e brinca com esse binarismo para se mover pelo pântano da política nacional. Qual a nova ideia e qual o movimento relevante que Aécio produziu? Sua espécie de Novo-direitismo com pendores panbrasileiristas não é, com efeito, a saída para os problemas do Brasil ou mesmo para a manutenção da Ordem que é, hoje, se vê ameaçada pelo reformismo banho-maria dos petistas - diria que mesmo eleitoralmente, isso é muito pouco, depende mais dos erros de Dilma para dar certo do que qualquer outra coisa.
E assim segue o PSDB, sendo a coisa mais parecida com a excêntrica ideia hobbesiana da "guerra de todos contra todos" que a política brasileira de hoje poderia reproduzir...
Hugo Albuquerque é estudante de direito e blogueiro em São Paulo.
Fonte:
O PSDB e a Guerra de Todos contra Todos

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